domingo, 10 de fevereiro de 2008



Quando eu nasci, era só uma boca. O médico falou, “não liga as trompas, não vai vingar...”. Bateram e chorei, mas nunca superei. Quantas vezes me olhei no espelho e voltei do outro lado, de muitos anos atrás, uma criança rechonchuda, dizendo: — não vai sobreviver. Não sobrevivi. São pedaços de mim que se grudaram, mas não sobrevivi. Entre minha cabeça e minha barriga, peitos que não são meus, mas da primeira menina que beijei. Entre as pernas um apêndice que simplesmente apareceu. Que faço da vida com esses pedaços que não se entendem? Que faço? Dôo. Não pedi um pau, não pedi uma língua. Sigo vivendo com retalhos que se estranham. Estranham a mim e aos outros.

— e o que não consola é que os pedaços dos outros sejam tão parecidos com os meus.

Um comentário:

Denis Forigo disse...

as vezes o Laerte cavoca fundo, como dizem na minha terra...